Pelo terceiro ano seguido, a Finlândia foi eleita o país mais feliz do mundo, segundo a edição mais recente do World Happiness Report. Revelado pelas Nações Unidas na última sexta-feira (20/3), o relatório mostrou os nórdicos novamente como principal destaque coletivo: Dinamarca, Islândia, Noruega e Suécia apareceram, respectivamente, em segundo, quarto, quinto e sétimo lugares. Mas, neste ano, a pergunta se impõe: o que significa ser o país mais feliz do mundo em meio à crise de escala planetária desencadeada pelo coronavírus?
O ranking classifica 156 países de acordo com critérios relacionados ao bem-estar: renda, liberdade, confiança, expectativa de vida saudável, apoio social e generosidade. A partir desses quesitos, é possível avaliar a satisfação dos indivíduos no longo prazo. Em outras palavras, a pandemia da Covid-19, infecção respiratória causada pelo vírus, é, sim, um desafio gigantesco – seja para finlandeses, seja para brasileiros – mas a felicidade vai além da preocupação de momento: ela se baseia na confiança de que o país – com suas redes de apoio, a postura de suas autoridades, sua cultura de cooperação – vai superar as dificuldades.
“Grande parte do bem-estar passa por uma assistência médica de boa qualidade”, disse à rede CNN Samuel Kopperoinen, um empreiteiro de Helsinque. “O povo finlandês tem a sensação de que, em caso de doenças e deficiências, receberemos tratamento. Confiamos na qualidade e disponibilidade desses serviços.” Casado em com três filhos, ele atesta ainda o peso que tem a rede de segurança social do país. “Ela nos ajuda se perdermos o emprego, ficarmos doentes ou nossos filhos adoecerem. Perderemos renda, mas podemos obter compensação, o que nos ajuda a sobreviver e ajustar nosso consumo diário.”
Como a postura das autoridades importa
Mas não se trata apenas de benefícios legais, oferecidos pelo Estado como assistência médica, educacional ou contra o desemprego, afirma ele. A cultura de apoio ao próximo manifesta-se em momentos de comoção coletiva, como o atual, e isso também ajuda a construir a felicidade. “Prefeituras e igrejas estão organizando iniciativas para ajudar suas comunidades.”
Jeffrey Sachs, um dos autores do World Happiness Report, diz que estar no topo do ranking da felicidade não será antídoto para os países enfrentarem o coronavírus. Em contrapartida, ele reforça a importância do trabalho dos governos para liderar o país nesse momento de grande provação para todos. “Estou certo de que os governos que funcionam bem acabarão se saindo melhor. Essa epidemia requer governos e ações fortes e eficazes”, afirma Sachs, professor de economia e diretor do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade Columbia, nos Estados Unidos.
Espírito de união
Quando uma pandemia como o coronavírus ataca a saúde e a renda dos cidadãos de um país, “uma sociedade com alta confiança (mútua entre as pessoas, e das pessoas nas instituições) busca naturalmente encontrar formas de trabalhar junta para reparar os danos e reconstruir vidas melhores”, diz o relatório. “Isso às vezes levou a aumentos surpreendentes de felicidade na esteira do que poderia parecer um desastre sem solução.”
“A explicação parece estar na surpresa das pessoas com a disposição de seus vizinhos e instituições de trabalhar em conjunto para ajudar uns aos outros”, continua o relatório. “Isso reforça um senso de pertencimento e orgulho pelo que eles conseguiram alcançar juntos. Às vezes, esses ganhos são fortes o suficiente para compensar as perdas materiais.”
O professor finlandês de história e educação cívica Ville Jäättelä concorda. Ele não acha que o governo da Finlândia seja perfeito, mas disse confiar que os atuais líderes do país farão o melhor possível nesta crise. “Talvez, no futuro, possamos pensar sobre o que estamos fazendo agora e identificar medidas que deveriam ter sido tomadas antes, mas acabaram não sendo”, afirmou. “Mas, durante uma crise como essa, eles (governantes) precisam atuar com as informações que possuem.”